No coração do pensamento marxista, um conceito se destaca como fundamental para compreender a história e o desenvolvimento das sociedades: as forças produtivas. Qualquer análise marxista séria, seja uma introdução didática ou um estudo aprofundado, irá mencionar esse termo repetidamente. Afirmações como "uma sociedade entra em decadência quando suas forças produtivas deixam de se desenvolver" ou "o capitalismo, em certo estágio, torna-se incapaz de impulsionar as forças produtivas, exigindo sua superação" são recorrentes na tradição marxista. Mas o que exatamente significa "forças produtivas"?
Muitos cometem o erro de confundir forças produtivas do trabalho com forças produtivas sociais, humanas e gerais. Embora relacionadas, essas categorias possuem distinções fundamentais que precisam ser esclarecidas.
Desde o Iluminismo, a racionalidade foi elevada a um pedestal, um instrumento das elites para justificar a dominação e deslegitimar aqueles que ousassem se guiar por outros princípios. Reis, generais e empresários foram aclamados como líderes naturais porque, segundo essa narrativa, nasceram racionais. Essa mesma lógica foi usada para justificar o colonialismo, como quando Rudyard Kipling escreveu O Fardo do Homem Branco, incentivando os EUA a se lançarem na missão civilizatória. John Stuart Mill, um dos grandes nomes do liberalismo, defendia o "despotismo benevolente" britânico na Índia, pois via os colonizados como incapazes de abrir mão de seus desejos individuais em nome de algo maior. Para esses homens, povos originários e colonizados eram meras crianças barulhentas, guiadas pela emoção, assim como as mulheres no Ocidente, que deveriam ser mantidas longe da política para evitar "desordens" emocionais.
O que é lugar de fala, afinal?
"Lugar de fala" não é um veto, tampouco uma mordaça. É uma ferramenta de análise crítica das relações de poder que estruturam quem fala, quem é ouvido, e quem é sistematicamente silenciado. Surgido de uma tradição teórica e política do feminismo negro e da epistemologia situada, o conceito convida à reflexão sobre a posição social de quem fala, e não à interdição do discurso alheio.
Djamila Ribeiro, em O que é lugar de fala?, explica que esse termo não significa que só quem vive determinada opressão pode falar, mas que a experiência vivida molda perspectivas e confere autoridade epistêmica. Isso se apoia em autoras como bell hooks, Patricia Hill Collins, Donna Haraway e Gayatri Spivak, todas elas críticas às estruturas que invisibilizam vozes subalternizadas, mas também profundamente comprometidas com o diálogo transformador.
"Deus está morto", mas e se ele ainda não soubesse disso? Slavoj Žižek nos provoca com essa ideia ao reinterpretar o conceito de Nietzsche sob a ótica da psicanálise lacaniana. Se a modernidade proclamou o fim da tutela divina e a libertação do homem, por que ainda permanecemos presos a novas formas de servidão?
A resposta de Lacan é inquietante: a morte de Deus não significa o fim da crença, mas sua migração para o inconsciente. O que nos governa não é mais um Deus visível, mas um Deus morto-vivo, um grande Outro simbólico que dita nossas ações sem que percebamos.
Noam Chomsky é um dos intelectuais mais influentes do século XX e XXI. Seus trabalhos vão muito além da linguística – campo em que revolucionou a teoria da linguagem –, tornando-se um crítico feroz do imperialismo, da mídia corporativa e das estruturas de poder que sustentam a opressão global.
Surgindo na cena acadêmica nos anos 1960, Chomsky não apenas desafiou a visão tradicional da linguagem, mas também confrontou o establishment político, denunciando as atrocidades da Guerra do Vietnã e o papel das grandes corporações na manipulação das massas. Sua obra se tornou um instrumento fundamental para quem busca entender como o poder se perpetua e como podemos combatê-lo.
Vivemos tempos confusos, em que a política parece cada vez mais um jogo de espelhos onde a direita distorce a realidade para criar inimigos imaginários e justificar seu avanço. No meio dessa guerra ideológica, muitas pessoas, mesmo aquelas que não compactuam com a extrema direita, acabam comprando a narrativa de que as pautas progressistas e identitárias estão "destruindo a sociedade". Mas de onde vem essa ideia?
A crítica anarquista à tomada do poder estatal é frequentemente caricaturada como uma oposição moral abstrata ao Estado, ignorando as realidades concretas do mundo em que vivemos. No entanto, uma leitura atenta dos clássicos anarquistas revela que sua oposição à tomada do poder estatal era baseada em razões profundamente pragmáticas: o Estado é um meio impróprio para alcançar os objetivos revolucionários.
Os anarquistas compreendem a sociedade como o resultado da interação entre seres humanos, suas consciências e suas atividades. Quando trabalhadores entram em greve, por exemplo, eles não apenas lutam por melhores condições, mas também transformam a si mesmos e suas relações sociais. Eles aprendem a se auto-organizar, desafiam a autoridade dos patrões e constroem laços de solidariedade. Isso está alinhado com a teoria da práxis, uma perspectiva compartilhada por anarquistas e marxistas.
A partir dessa perspectiva, há uma conexão intrínseca entre meios e fins. O objetivo final do anarquismo é uma sociedade sem classes, sem Estado, baseada na autogestão dos trabalhadores e na propriedade coletiva dos meios de produção. Essa sociedade será sustentada através da organização descentralizada em conselhos locais e federações regionais, onde todas as decisões serão tomadas democraticamente pela base.
Se queremos que essa sociedade surja, precisamos utilizar meios que ajudem a criar as condições humanas e sociais para tal. Se adotarmos meios errados, criaremos uma realidade oposta ao nosso objetivo. Como afirmou Malatesta: "É preciso, entretanto, que os meios empregados para a obtenção dessas melhorias não estejam em contradição com a sua finalidade, isto é, que não impliquem, nem indiretamente, no reconhecimento da presente ordem de coisas por nós condenada e possam preparar a estrada do futuro".
A discussão sobre os problemas estruturais da sociedade costuma esbarrar sempre na mesma resposta clichê: "o problema é a corrupção". Esse argumento, repetido à exaustão por liberais, conservadores e até mesmo por setores da esquerda autoritária, nos leva à ilusão de que tudo poderia ser resolvido apenas se "as pessoas certas" chegassem ao poder. Esse raciocínio tem um nome: "a teoria do grande homem", a crença de que basta um líder virtuoso para guiar a sociedade para um futuro melhor. Mas a realidade nos mostra outra coisa.
Liberais argumentam que precisamos apenas de normas sociais mais progressistas e de políticos que representem essas pautas. Conservadores dizem que a decadência moral e o afastamento de valores tradicionais são o verdadeiro problema. A esquerda autoritária afirma que um partido de vanguarda ideologicamente puro é necessário para guiar o proletariado sem desvios revisionistas. Apesar das diferenças de abordagem, todos esses grupos partem da mesma premissa: o sistema é funcional, só precisamos das "pessoas certas" para ocupá-lo.
A sociedade ama rótulos. Eles facilitam a ilusão de que o caos político pode ser ordenado em caixinhas bem definidas. "Esquerda" e "direita" são dois dos termos mais usados para descrever posições políticas, mas são também os mais vazios de significado real. No final das contas, são apenas construções discursivas utilizadas para reforçar o controle sobre nossas mentes e perpetuar estruturas de domínio.
Quantas pessoas, neste exato momento, estão deslocadas? Quantas buscam refúgio em outro país, emprego em outra terra, fugindo da violência, da miséria, do colapso climático ou de guerras causadas pelos interesses dos mais ricos? Quantas foram obrigadas a partir porque suas casas, suas terras e seus meios de subsistência foram saqueados por corporações e governos imperialistas?
O número é esmagador: mais de 1 bilhão de migrantes no mundo. Desses, 80 milhões são deslocados à força, incluindo 45,7 milhões que permanecem dentro de seus próprios países, mas sem acesso a um lar seguro. Aproximadamente 45% dos deslocados são menores de 18 anos. Se a população mundial gira em torno de 7 bilhões, isso significa que 1 em cada 7 pessoas no planeta é um migrante.
Para se ter uma noção do impacto, há mais migrantes na Terra do que a população combinada dos Estados Unidos, Canadá, Alemanha, Reino Unido, França, Itália e Japão. No entanto, a resposta dos países mais ricos a essa crise tem sido construir muros e endurecer suas fronteiras, enquanto continuam explorando os países dos quais essas pessoas fogem.