Se há um conceito psicanalítico que ecoa como uma navalha na carne da experiência cotidiana, esse conceito é o gozo em Lacan. E não é à toa que ele é um dos mais discutidos e debatidos na psicanálise: ele revela algo profundamente incômodo sobre nós mesmos e sobre o mundo em que vivemos.
"Deus está morto", mas e se ele ainda não soubesse disso? Slavoj Žižek nos provoca com essa ideia ao reinterpretar o conceito de Nietzsche sob a ótica da psicanálise lacaniana. Se a modernidade proclamou o fim da tutela divina e a libertação do homem, por que ainda permanecemos presos a novas formas de servidão?
A resposta de Lacan é inquietante: a morte de Deus não significa o fim da crença, mas sua migração para o inconsciente. O que nos governa não é mais um Deus visível, mas um Deus morto-vivo, um grande Outro simbólico que dita nossas ações sem que percebamos.
Sigmund Freud desafiou a medicina tradicional ao propor que as doenças mentais não eram apenas degenerações físicas ou delírios sem sentido, mas sim expressões reprimidas do inconsciente. Em Cinco Lições sobre a Psicanálise, Freud desmistifica a loucura, rejeitando a visão opressiva que isolava os "alienados" em prisões e hospícios.
O inconsciente, essa força invisível que molda nossos desejos e medos, desafia a ideia de que somos plenamente racionais. Freud mostra que as repressões sociais e morais empurram impulsos para as sombras da mente, onde se manifestam como sintomas neuróticos. E o que isso tem a ver com libertação? Tudo. Porque compreender a psicanálise é também compreender como as normas e as estruturas de poder condicionam nossos pensamentos e desejos.
O capitalismo não é apenas um sistema econômico. É uma máquina de moer corpos e forjar subjetividades doentes. Exaustão e ansiedade não são desvios – são efeitos colaterais estruturais de uma lógica que exige rendimento infinito, produtividade sem limites e autoexploração disfarçada de liberdade.
Vivemos sob um regime onde o poder não mais proíbe – exige. Não mais castiga – motiva. A frase “Yes, we can!”, que antes carregava promessas de emancipação, virou um imperativo cruel: se você não consegue, a culpa é sua.
O filósofo sul-coreano Byung-Chul Han, em Sociedade do Cansaço, nos mostra que deixamos para trás a sociedade da disciplina – do “não pode!” – e entramos na era da positividade, onde nasce o sujeito de desempenho: alguém que não é mais dominado por outro, mas por si mesmo. Somos ao mesmo tempo o chefe e o capataz, o explorador e o explorado. E quando colapsamos, quando não damos conta, ainda nos culpamos por isso. A isso, Han chama de violência neuronal – uma forma de violência que não vem de fora, mas brota de dentro de nós mesmos.
O amor materno, essa ideia romantizada e vendida como um instinto natural, é na verdade um construto social que reflete a necessidade do capitalismo de manter corpos produtivos e reprodutivos em ordem. Desde cedo, a mulher é condicionada a acreditar que seu papel primordial é gestar, nutrir e proteger. Mas o que acontece quando essa narrativa não se sustenta?
O eu está sempre em guerra consigo mesmo. Essa é a condição fundamental da existência humana: o conflito interno, a tensão entre desejo e repressão, entre impulso e ideal, entre aquilo que queremos e aquilo que nos é imposto. A ideia de um eu unificado, coerente, que caminha sempre ao lado de si mesmo, não passa de uma ficção conveniente, uma ilusão imposta pelo discurso dominante.
Quem somos nós? A identidade que carregamos é real ou apenas uma construção imposta pelo mundo? O psicanalista Jacques Lacan, influenciado por Freud, trouxe em 1936 uma teoria que desafia a ideia de um "eu" unificado e autêntico. Para ele, a identidade que acreditamos ter é uma ilusão—um reflexo que esconde nossa verdadeira subjetividade.
Vivemos numa sociedade que insiste em transformar o sexo num tabu, numa coisa suja, num produto a ser escondido e vendido ao mesmo tempo. O capitalismo sequestra nosso desejo e nos empurra para um consumo compulsivo de pornografia enquanto demoniza a sexualidade real, espontânea, libertária. Mas por quê?
Napoleão Bonaparte já dizia que a religião é excelente para manter as pessoas comuns quietas, pois impede os pobres de matarem os ricos. A religião não é apenas um conjunto de crenças espirituais, mas um sistema de controle que perpetua desigualdades, condiciona mentalidades e garante a submissão das massas. Sua função primordial é servir à ordem estabelecida, anestesiando os explorados com promessas vazias e normas morais imutáveis.