Para Além de Deus e do Capital: Reapropriar Nossa Potência e Nosso Prazer

Por que criamos deuses? E, depois de criá-los, por que aceitamos que eles nos governem? Esta não é uma questão teológica, mas o cerne de um problema político radical. Dois pensadores, aparentemente distantes, nos dão as chaves para uma resposta devastadora: a religião é uma tecnologia de poder que administra nossos desejos e nosso medo para nos manter obedientes.

O alemão Ludwig Feuerbach e o francês Georges Bataille nunca se encontraram, mas suas ideias, em diálogo, revelam os mecanismos profundos de como nos alienamos — e como podemos nos reapropriar de nós mesmos.

Publicado em 10/09/2025

Ideologia: A Máquina de Ilusões do Capital

A ideologia — nesse léxico específico — não é uma simples coleção de ideias ou um sistema neutro de crenças. Ela é um aparato, um dispositivo de dominação simbólica e material. Uma máquina engenhosa criada para garantir que o explorado não apenas aceite sua exploração, mas a defenda como se fosse parte da ordem natural das coisas. É, nesse sentido, o ferramental da burguesia para mascarar a realidade da luta de classes.

Publicado em 20/04/2025

As Raízes Biológicas da Religião: Por que os Ateus são Diferentes?

A religião é um fenômeno quase universal na história humana, presente em praticamente todas as culturas e sociedades. No entanto, uma minoria significativa de pessoas — os ateus — não sente a necessidade de acreditar em um Deus tradicional ou em qualquer força sobrenatural que explique a origem do universo. Por que essa diferença? Seriam os ateus mais inteligentes, mais esclarecidos ou psicologicamente mais maduros? Ou há algo mais profundo, talvez biológico, que explica essa divergência? Morton Hunt, em seu texto As Raízes Biológicas da Religião, explora essas questões, oferecendo uma análise fascinante sobre as origens evolutivas da religião e as possíveis razões pelas quais os ateus são diferentes da maioria da humanidade.

Publicado em 13/11/2024

O Inferno do Mesmo: Notas sobre Byung-Chul Han e a Auto-Exploração como Nova Morfologia do Poder

A diagnose de Byung-Chul Han é precisa como um bisturi e, para nós, anarquistas, profundamente familiar em sua descrição do sintoma, ainda que radicalmente divergente em sua prescrição. Han identifica com clareza a mutação do poder disciplinar descrito por Foucault – a sociedade do “não”, da norma, da interdição e do confinamento – para a sociedade de rendimento do “sim”. Uma sociedade que já não precisa de um tirano externo, pois cada indivíduo se tornou o capataz de si mesmo.

Este é o triunfo final e mais perverso da biopolítica: a internalização completa do mecanismo de exploração. O projeto anarquista clássico, centrado na luta contra um opressor identificável – o Estado, o Capital, o Patrão – vê-se diante de um novo e mais insidioso inimigo: o sujeito de rendimento. A liberdade, gritada como mantra pelo neoliberalismo, revela-se aqui em sua nudez obscena: é a liberdade de se explorar até o colapso neuronal. A coerção não desapareceu; tornou-se idêntica à própria noção de liberdade. Este é o cerne da nova servidão voluntária.


Publicado em 11/10/2024

A Dialética Materialista: Uma Crítica à Tradição Filosófica e ao Capitalismo

A tradição filosófica dominante na Europa até o início da modernidade estava profundamente enraizada na ideia de um mundo além do sensível, um reino de essências imutáveis e substâncias eternas que seriam os verdadeiros objetos do conhecimento. Nessa visão, o movimento e a transformação no mundo fenomênico eram vistos como meras aparências ou como parte de um ciclo predeterminado que não afetava o ser das coisas, sempre idêntico a si mesmo. Essa perspectiva estática começou a ser desafiada com o advento de formas mais dinâmicas de entender a realidade, culminando na filosofia idealista de Hegel.

Publicado em 20/03/2024

Encontrar Sentido Num Mundo Sem Fins

Viktor Frankl (1905-1997) sobreviveu a quatro campos de concentração nazistas e, das cinzas, cunhou a Logoterapia: uma psicoterapia centrada na busca de sentido como força vital.
Enquanto a psicologia mainstream vende a autoajuda da “felicidade de Instagram” e o cognitivo-comportamental é reciclado como treinamento corporativo, a obra de Frankl mantém um brilho estranho: ela insiste que o ser humano não é máquina de prazer nem de poder—é um animal faminto de significado.


Publicado em 29/04/2020

Relações de Produção e a Contradição Capitalista

Dentro da tradição marxista, os conceitos de relações de produção e forças produtivas são essenciais para compreender a dinâmica histórica e material da sociedade. A confusão comum é tratar esses conceitos como elementos abstratos ou predeterminados, mas a perspectiva materialista da história, tal como formulada por Karl Marx, indica que eles devem ser analisados dentro de cada contexto social específico.

Publicado em 26/06/2019

A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado: Uma Leitura Anarquista

Friedrich Engels escreveu A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado baseado nas notas de Karl Marx sobre os estudos antropológicos de Lewis H. Morgan. O livro traça a evolução histórica das estruturas familiares, o surgimento da propriedade privada e a consolidação do Estado como aparato de dominação de classe. Para os anarquistas, essa obra é fundamental — não por acaso, pensadores como Piotr Kropotkin e Mikhail Bakunin já haviam chegado a conclusões semelhantes sobre a natureza coercitiva do Estado e da propriedade.

Publicado em 03/01/2017

Como Identificar o Fascismo: As 14 Características do Ur-Fascismo Segundo Umberto Eco

Por um punho anarquista erguido contra a tirania

O fascismo não morreu. Ele apenas se metamorfoseou — trocou as botas militares por ternos de grife, substituiu os discursos inflamados em praça pública por algoritmos de redes sociais e think tanks financiados por bilionários. Mas sua essência permanece a mesma: o culto à autoridade, o ódio à liberdade e a obsessão por controlar os corpos e as mentes.

Umberto Eco, em O Fascismo Eterno, nos oferece uma bússola para navegar esse pesadelo político. Não se trata apenas de lembrar Mussolini ou Hitler, mas de reconhecer os traços do fascismo em qualquer época, em qualquer lugar — inclusive no presente. Como anarquistas, sabemos que o Estado, o capital e a hierarquia são os pilares que sustentam essa máquina de opressão. E, como diria Malatesta, o fascismo é a face mais brutal do Estado quando ele se sente ameaçado.

Abaixo, desmontamos as 14 características do Ur-Fascismo, não como um exercício acadêmico, mas como um manual de sobrevivência. Porque, como bem lembrava Lucy Parsons: "Nunca implore por justiça. Pegue-a."

Publicado em 19/12/2014

Desmistificando a Dialética: Para Além do Materialismo de Marx

A palavra dialética ronda os círculos da esquerda como um fantasma familiar. Todos a citam, muitos a invocam, mas poucos se dedicam a desemaranhar seus fios históricos. Ela é mais antiga, mais complexa e mais insidiosa do que o “materialismo dialético” de Marx pode sugerir.

Compreender a dialética em sua raiz é essencial para que não reproduzamos, mesmo sem querer, lógicas autoritárias e hierárquicas que buscamos combater. A dialética não é uma ferramenta neutra, mas uma forma de ver o mundo — um hábito cultural enraizado na história do pensamento ocidental, capaz tanto de servir à liberação quanto à dominação.

Publicado em 10/10/2013